VILTO REIS

Prolepse, Analepse, Flashforward e Flashback na literatura – Entenda cada um deles, como e quando usar

Basta começar a ler ficção. Você vai se deparar com o flashback na literatura, ou seja, uma ferramenta de manipulação temporal. Um domínio essencial para qualquer escritor.

Mas você já pensou que existem inúmeras outras ferramentas para lidar com o tempo?

E ainda mais. Há vários tempos possíveis. Quem escreve ficção, precisa trabalhar com todas essas possibilidades.

Ou pode escrever sem saber delas.

E, desta forma, perderá uma parte importante do fazer literário. Pois o domínio do tempo dentro da narrativa pode significar  a diferença entre manter ou não um leitor em seu texto.

Continue lendo este artigo para aprender:

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O que é o tempo na literatura?

O biógrafo, novelista, crítico e escritor João Gaspar Simões escreveu o seguinte:

“O ficcionista é senhor do espaço e do tempo em que a própria vida humana se realiza. É assim que podemos acompanhar Henry Esmond ao longo de toda a sua vida e que Hamlet poucas horas passará conosco. Em um dia de leitura podemos viver anos e anos da existência das personagens de uma ficção.”

O tempo dentro da narrativa trata de uma experiência que só a ficção proporciona. Podemos em uma frase ler o resumo de toda uma vida. Ou em 1000 páginas ler apenas um dia de vida de um personagem.

Este tempo é uma escolha do escritor.

Afinal de contas, uma narrativa nada mais é do que o recorte da vida de alguém. Dificilmente, teremos em nossos dias uma história que trate do nascimento à morte de um personagem.

E essa escolha que você faz é a manipulação do tempo. Ou seja, como contar essa história da forma mais atrativa possível ao leitor?

Vou começar do ponto crítico da vida do personagem? Talvez, em seguida, apresente todas as complicações que o levaram até ali? Este é um exemplo da manipulação do tempo, de uso do flashback na literatura. Mas como já comentado, podemos usar ainda o flashforward, a Analepse e a Prolepse.

Para facilitar a compreensão, vamos ver ainda os quatro tipos de tempo na literatura.

 

Os 4 tipos de tempo na literatura

Basicamente, o ficcionista trabalha entre os quatro tipos de tempo que vou apresentar abaixo. Dominar essas variantes trará um acréscimo às suas possibilidades de escrita.

Vamos a eles.

Tempo histórico

Situa o leitor no momento histórico em que a narrativa acontece. Por exemplo: é na época dos gregos, na Idade Média, nos dias de hoje ou no futuro?

Tempo psicológico

O mais subjetivo de todos. Trata-se da percepção do tempo por aquilo que é vivido ou sentido no estado de espírito do personagem. Podemos ter um tempo psicológico longuíssimo em um curto período de tempo real.

Tempo cronológico ou tempo da história

Basicamente, podemos entender como a sequência cronológica em que os acontecimentos apresentados na história aconteceram.

Tempo do discurso

É a manipulação que o narrador faz do tempo cronológico, escolhendo narrar em uma ordem diferente da que os fatos ocorreram. Exemplo: pode contar em ordem linear, alterando a ordem temporal (com flashback, flashforward, analepse ou prolepse), ou alternando entre narrar uma cena dramatizando a ação e, em seguida, resumindo-a (o nome deste recurso é sumário).

A partir da manipulação desses 4 tempos, podemos então nos aprofundar mais em recursos temporais.

 

Prolepse e analepse – A chave do mistério e do suspense

De forma geral, há muita confusão sobre os termos. E, acredite, não sou das pessoas que defendem que você “decore” as palavras. Mas sim que você aprenda os conceitos.

Então vamos começar diferenciando o que são prolepse e analepse. Depois vamos ver como usá-las. Vou utilizar um exemplo de Gabriel Garcia Marquez.

Analepse

Não é uma cena, mas uma referência (talvez citação) ao passado do personagem. Um passado que muitas das vezes está localizado antes do início do discurso.

Prolepse

Uma referência ao futuro do personagem. Algo bem mais comum do que se imagina. Frequente naquelas situações que o personagem tem um foco, um destino, traçado a seguir.

Um exemplo incrível de uso de analepse e prolepse se encontra no início do livro Cem anos de solidão, de Gabriel Garcia Marquez. Vejamos o texto:

“Muitos anos depois, diante do pelotão de fuzilamento, o Coronel Aureliano Buendía havia de recordar aquela tarde remota em que seu pai o levou para conhecer o gelo. Macondo era então uma aldeia de vinte casas de barro e taquara, construídas à margem de um rio de águas diáfanas que se precipitavam por um leito de pedras polidas, brancas e enormes como ovos pré-históricos. O mundo era tão recente que muitas coisas careciam de nome e para mencioná-las se precisava apontar com o dedo.”

Para explicar, podemos nos deter na primeira frase.

Começamos com uma prolepse: “Muitos anos depois…”. Em seguida temos o tempo presente: “…diante do pelotão de fuzilamento…” E há o arremate com a referência ao passado, analepse, do personagem: “…o Coronel Aureliano Buendía havia de recordar aquela tarde remota em que seu pai o levou para conhecer o gelo.”

A aplicação aqui contribui para criação de mistério e suspense. Algo que o escritor Maicon Tenfen em Breve estudo sobre o foco narrativo (ver na Amazon) faz questão de ressaltar.

Segundo ele, com analepses cria-se mistério na história e suspense no discurso. Já com prolepses, acontece o contrário. Surge o suspense na história e mistério no discurso.

Alguém dirá: mas essa analepse não é a mesma coisa que o flashback na literatura?

 

Diferenças de Prolepse e Analepse para Flashforward e Flashback na literatura ou no cinema

A confusão é muito frequente. Embora seja muito simples de entender.

Enquanto a analepse é apenas uma referência ao passado, o Flashback é a aparição daquela cena do passado em sua totalidade. Da mesma forma, a prolepse é só uma citação. O flashforward, por sua vez, é a dramatização da cena completa.

Você pode então se perguntar:

Quando usar cada um deles?

Geralmente, o uso exagerado do flashback na literatura acaba comprometendo um texto. Ele torna-se “chato” e parece que a ação não avança. Logo, o uso dessa ferramenta temporal pode ser usado para intensificar o drama da história. Mas sem exageros.

Nesta possibilidade, antes da aparição do flashback, poderíamos fazer uma citação ao passado do personagem. Esta analepse iria intensificar a curiosidade do leitor.

Em uma outra história, podemos por meio de um vidente apresentar um flashforward. Ou seja, conhecer o futuro do nosso personagem através da apresentação de uma cena desse futuro. Ou por meio de constantes prolepses, fazer referências ao seu destino. Tais quais as de Édipo, que na história clássica iniciamos sabendo que ele irá matar seu pai e casar com sua mãe.

Estas são apenas algumas das infinitas possibilidades que se apresentam no uso dessas ferramentas temporais.

Repito: não se preocupe em decorar os termos. Foque em aprender os conceitos. Esses conceitos sim serão de grande valia para a sua escrita. Portanto, aplique-os.

***

A última coisa que me resta dizer é: se ficou alguma dúvida, use e abuse dos comentários. Vamos continuar falando sobre este tema?

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